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Afinal, o que é um roteiro?

Atualizado: 26 de abr.


Um roteiro é a criação prévia e estruturada de uma obra audiovisual em forma de texto. É um gênero textual particular por não se tratar da forma final de uma criação artística, sendo, por isso, muito distinto de romances, poemas e ensaios. O roteiro possui uma natureza intermediária, aproximando-se de obras dramatúrgicas, cuja finalidade primordial é a realização da história narrada em outro formato. Neste artigo, vamos propor uma definição básica de um roteiro de ficção, destacar seu objetivo na produção de uma obra audiovisual e apresentar as principais características do formato.


Para fazer um grande filme você precisa de três coisas: o roteiro, o roteiro e o roteiro ”*

Imagem: reprodução. * Alfred Hitchcock, citação presente em Bean: The Script Book (HarperPerennial, 1997) by Richard Curtis and Robin Driscoll, p. 7


Primeiro, vamos elaborar uma definição mais completa de um roteiro ficcional.


Definição de roteiro:


Um roteiro é a história de um filme, série, ou outra realização audiovisual narrado em forma de texto, contendo a indicação de cenários, personagens, ações e falas. Funciona como mapa de realização da obra. Trata-se tanto de uma criação artística quanto de um instrumento de trabalho. Por essa característica, possui um formato específico.


Antes de conhecer as regras de formatação de um roteiro, é válido entender os motivos dessa padronização e o objetivo da existência do roteiro.


Que filme é esse?


A produção de uma obra audiovisual é um trabalho coletivo – e caro. É importante, portanto, que toda equipe envolvida possua uma base em comum para executar suas funções. O roteiro fornece justamente este guia para que a produção e a direção possam executar um determinado projeto de maneira coesa e, à medida do possível, econômica.


Imagine a seguinte situação: toda uma equipe de produção é mobilizada para filmar uma cena, porém a única indicação do “roteiro” é “em casa, um casal discute a relação”. Vamos supor que lacunas essenciais, como a definição da idade e gênero do casal, a hora do dia ou da noite e em qual ambiente da casa a discussão se passa – questões que já deveriam estar explicitadas no roteiro – foram previamente resolvidas pela equipe. Ainda assim o diretor(a), elenco, fotografo(a), diretor(a) de arte, figurinista, maquiador(a), teriam uma infinidade de questões a resolver: como a discussão começa e quando termina? O que é dito? Como reagem ao que é dito? Como estão vestidos? Qual o estado emocional dos personagens? Qual intenção da cena? Etc. etc. etc. Sem contar o principal, como esta cena se encaixa no andamento da história como um todo? Quais ligações ela estabelece com aqueles personagens? Não é difícil imaginar que tal cena levaria horas, senão dias, para ser filmada de maneira minimamente satisfatória, levando a uma grande perda de tempo e a um alto custo.


Obviamente, este é um exemplo extremo. Mas deixa nítido que o principal objetivo do roteiro é fazer com que todos os envolvidos visualizem o mesmo filme, para que assim possam produzi-lo de modo eficiente. A maneira encontrada para diminuir mal entendidos foi a padronização do formato do roteiro. Através dela é possível entender a história e antecipar decisões essenciais para sua realização.


Breve histórico das transformações do roteiro


Como tudo, o formato do roteiro que conhecemos hoje é um produto da história, especificamente da história do cinema e do estabelecimento da hegemonia audiovisual americana.

Nos primórdios das imagens em movimento, a produção de filmes contava com alto grau de experimentação. As obras eram mudas e duravam apenas poucos minutos. O que conhecemos como roteiro era chamado de Scenarios, constituía-se em um texto breve, contendo apenas indicações básicas de ação e da trama.


Conforme os filmes ficaram mais elaborados, a necessidade de planejamento aumentou. Le Voyage dans la lune (1902), de George Méliès, é considerado por alguns como a primeira obra com um roteiro minimamente próximo ao que temos hoje, contendo variações de ambientes e breves descrições das cenas. Outros autores da época continuaram com a padronização iniciada por Méliès, consolidando o formato que é conhecido hoje como The Original Master Scenes.


A popularização dos filmes atraiu investidores com uma visão mais empresarial para o meio cinematográfico, como consequência, a experimentação deu lugar a eficiência e os roteiros passaram a atender principalmente às necessidades do controle executivo. Transformaram-se em instrumento para programar custos e tempo de produção, contendo, assim, uma série de indicações técnicas para a filmagem. Em datas aproximadas, esse período perdurou entre 1920 a 1948 e consolidou o formato denominado The Continuity Script.


A partir dos anos 1950, o fim da “Era dos estúdios” transformou radicalmente a indústria cinematográfica americana. Por um lado, concedeu maior liberdade criativa aos roteiristas e diretores, por outro, criou a necessidade de transformar o roteiro em algo vendável, levando os roteiristas a priorizar uma narração direta e envolvente da história no lugar da descrição de detalhes técnicos de produção, inaugurando o formato Master Scenes, padronização do roteiro ainda em voga atualmente.


É claro que, ao longo da história, existiram formas alternativas de roteiro e de produção de filmes. O cinema, e consequentemente o roteiro, é uma manifestação artística, como tal, não se limita por regras e padrões fixos. É inegável, no entanto, que os fatores econômicos envolvidos na produção de uma obra audiovisual exercem considerável influência nos modos e possibilidades de se fazer e escrever filmes, séries etc. Por isso, antes de reinventar a roda é recomendável entender o que a faz girar.


Dica de leitura – Caso se interesse pela história do roteiro e sua ligação com os meios de produção do cinema, nossa indicação é o livro “A history of the screenplay” de Steven Prince.


Agora que entendemos os motivos e um pouco da história do formato, é hora de apresentar as características elementares de um roteiro:


Cenários


O cenário é indicado através do cabeçalho da cena e deve definir o “Onde” e o “Quando”, isto é, se a ação se passa em um ambiente Interno ou Externo, em qual local e durante o período do dia ou da noite. Para citar apenas um exemplo pontual, tais definições são fundamentais para o planejamento da equipe de fotografia, afinal, é preciso programar de antemão o tipo de lente e equipamento de luz necessário para captar a cena.


Ação e Personagens


Um roteiro deve indicar o que e/ou quem deve ser filmado. Parte dessas descrições aparecem como linhas de ação (ou rubricas). Retomando o exemplo citado acima, em um roteiro padronizado a linha de ação da cena (“em casa, um casal discute a relação”) poderia começar com algo como “Fulano entra agitado no quarto. Beltrana lê tranquilamente na cama. Fulano se senta ao pé da cama de costas para Beltrana. Ela o ignora” – dessa forma, por pior que seja a cena, como é o caso, atores tem uma previsão do que devem fazer e o diretor pode programar os planos que deseja utilizar para captar a cena.


Diálogos


Um roteiro deve especificar o que é dito por cada personagem. A forma com que os personagens falam e respondem um ao outro é uma poderosa ferramenta que o roteirista tem para apresentar quem eles são e como pensam, além disso, é essencial para a equipe de som planejar e antever problemas e possíveis soluções para a captação da cena – caso você deseje, por exemplo, escrever uma declaração de amor sussurrada no meio de uma freira livre.


Esses são os elementos básicos de um roteiro ficcional, há muitas outras especificidades, como as transições e o uso de parênteses. Para conhecer os detalhes e demais elementos da formatação do roteiro confira nosso artigo “Como escrever um roteiro no formato Master Scenes”.

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